sábado, 29 de abril de 2023

O Doutor João Rodrigues

 O DOUTOR

 

JOÃO RODRIGUES

 

            Entre alegrias e tristezas, dois amigos de infância se separaram pelo destino, um se foi rumo à um mundo desconhecido, por obediência ao sonho do seu pai, que desde o dia do seu nascimento dizia:

            - Esse nosso filho será o nosso um doutor Filomena!

            E sempre confiante no marido a mulher argumentava:

            - Vamos esperar pelo tempo Durval. Nem sabemos se será a vontade dele quando crescer!

            Com aquele jeito de quem vivo obcecado Durval relatava:

            - De uma forma ou de outra ele será o nosso doutor...

            - Deus permita meu bem - relatou Filomena olhando o seu filho tão simples, nascido naquele lugar simples, como seria o tal doutor que Durval queria que ele fosse.

            Como vimos que a vontade do pai era ver o filho doutor. E essa vontade parecia traçar o destino do seu filho José, a ser no futuro o doutor, doutor José. O quanto o que o seu amigo Pedro não tinha um pai tão obstinado como era o seu Durval. Que na verdade, não esperava a hora de ver o seu filho se tornar rapaz para poder ir para capital estudar pra ser o doutor tão desejado.

            De maneira que num certo dia Durval relatou:

            - Ano que vem vou mandar José pra capital fazer o tal de pré-vestibular.

            Filomena fez de conta que nem ouviu o seu marido, pois dentro do seu coração estava a vontade de que José nunca saísse de perto dela...

            - Não sei se vou aquentar a saudade dele homem.

            Durval olhou ternamente para sua esposa e disse:

            - Vai ser bom mulher. Se for preciso nós vendemos as nossas terras e vamos com ele.

            Quando Durval falou em vender as terras Filomena se entristeceu e mesmo assim relatou:

            - É, assim Diva poderá até arrumar um casamento melhor lá na capital.

            Ao Filomena falar em casamento Durval ficou pensativo, pois para ele a sua filha Diva era e sempre iria ser a sua menininha que nunca ia sair de perto dele, de modo que meio triste relatou:

            - É mulher, ela não teve nem mesmo cabeça pra estudar. Não tivemos sorte com nossa filha. Ainda bem que o José será o nosso doutor.

            - Deus te ouça homem!

            De modo que Durval vendeu a sua terrinha e se foi pra capital, levando consigo a sua esposa e o casal de filhos que Deus lhe confiou. Nem mesmo procurou saber se essa era a vontade deles.

            - Acho que vou me sentir melhor nessa tal de capital que o pai tanto fala José - argumentou Diva com o seu irmão assentados lá nos dois últimos lugares do ônibus que aos pouco os levavam para distante, um lugar muito distante...

            - A vida é assim Diva, a gente nasce e vai crescendo, logo que começamos a entender da vida encontramos com decisões tomadas por nossos pais, nos arrancando de perto das coisas que aprendemos a gostar...

            José parecia triste com a saída do sertão, contudo se sentia orgulhoso por saber que o seu pai apostava todas as cartas  nele. Seria ele o seu filho doutor, e isso lhe fazia guardar dentro do peito toda a saudade dos seus amigos que nem mesmo sabia se iria encontrá-los novamente.

            - Meia hora para o almoço - informou o trocador do ônibus que os levavam para o desconhecido, a tal de capital.

            - Não gostei desta comida mãe - reclamou Diva acostumada com a comida de casa que sempre foi lhe oferecida nas horas certas por a sua dedicada mãe.

            - Pra mim estava ótima - relatou José só para alegrar o seu pai, mas dentro do seu coração ele daria tudo para ter de volta a casinho onde nasceu e receber com aquela dose excessiva de amor da sua mãe.

            - Vocês vão se acostumando filhos - argumentou Durval olhando para Filomena que em seguida falou:

            - Não é como a comida da gente filhos, mas assim que chegarmos na capital eu farei novamente a comido que vocês tanto gostam...

            E assim entraram no ônibus e foram dormir...

            - Durval, acorda homem, já chegamos!

            Quando Durval abriu os seus olhos se encheu de alegria ao ver tanta gente, até relatou:

            - Filho, chegamos, essa é a capital que tanto sonhei em ver você se formar filho...

            José se levantou e chamando Diva relatou:

            - Vamos Diva. Chegamos ao nosso novo lar, a tal da capital que o pai tanto fala.

            Quando Diva lançou o seu inocente olhar para a grande multidão de pessoas disse ao seu irmão:

            - Gostei desse lugar, aqui eu vou ser muito feliz.

            - E eu infeliz - murmurou José.

            Os passageiros que desciam do ônibus os observavam com ar de menosprezo, talvez por serem do interior. E aquilo incomodava José.

            - Eu vou ser doutor como deseja o meu pai, aí quero ver vocês me olharem com menosprezo.

            - Está falando sozinho José? - indagou Diva.

            - Só estou pensando alto...

            Este foi o primeiro contato estranho que José teve fora do lugar onde nasceu. Agora parecia enveredar pro rumo ao seu diploma de doutor.

            - Pra onde devemos ir? - indagou o motorista do táxi fitando o seu olhar de conquista nos lindos e inocentes olhos de Diva.

            - É a primeira vez que estamos aqui amigo. Queremos comprar uma casa e fixar morada nessa cidade, pois trouxe o meu filho José pra estudar pra doutor.

            - Bem senhor, eu só sou um motorista de táxi, minha missão é levar o passageiro ao seu destino, se quiser eu posso levá-los lá pra minha humilhada casa e assim veremos se encontramos a casa que o senhor deseja comprá-la.

            - Vejo no seu olhar uma grande generosidade amigo, ou gostou de mais alguma coisa?

            - Com todo respeito senhor, eu quero dizer que gostei verdadeiramente desta linda garota, qual o nome dela?

            - Diva, a sua criada! - exclamou a menina parecendo confirmar o seu encanto pelo motorista.

            - Daniel, princesa.

            Um grande silêncio tomou conto do ambiente e logo o motorista seguia avenida afora mostrando a cidade para a família recém chagada à capital.

            - Aqui é muito bonito mesmo não acha mamãe?

            - Sim filha - confirmou Filomena olhando para o motorista que pelo jeito da conversa seria o seu futuro genro...  

            Daniel por sua vez estava muito contente, pois dentro do seu coração estava um turbilhão de felicidade, até parecia não acreditar que tinha encontrado a menina que tanto procurou em cada passageiro que levava em seus destinos, pois até disse:

            - Estou muito feliz senhor, qual é mesmo o seu nome?

            - Vou lhe apresentar a família Daniel - interrompeu Diva dizendo:

            - Como já sabe o meu nome é Diva, meu irmão José, minha linda mãe Filomena e o meu querido papai, Durval.

            Depois da apresentação de Diva, Daniel se sentiu ainda mais atraído pela garota, pois até relatou:

            - Como ia dizendo seu Durval, a vida aqui na capital é muito boa, tenho certeza que vão gostar muito daqui, ah, estamos Chegando.

            Daniel estava muito feliz com aqueles passageiros que trazia, parecia ser um achado, pois durante o percurso da viagem os seus olhos e os de Diva pareciam estar interligados em algo muito especial, e na verdade este algo é o que chamamos de amor à primeira vista...

            José, no entanto estava com certo receio, pois era a primeira vez que via um estranho ser tão delicado com a sua família.

            Durval nem parecia estar ali, pois olhava pra cada rua que passava procurando pela universidade onde o seu filho seria doutor.

            Filomena observava a maneira que Daniel olhava pra Diva, como se ele estivesse se lembro de quando viu Durval pela primeira vez.

            Diva, ah, essa estava fixada no Daniel que nem mesmo se dava conta de que estava numa capital.

            De modo que ao descerem na casa do taxista, foram recebidos por seu Emerson e a senhora Cida acompanhados da linda Stéfane que se encantou ao ser apresentada ao José.

            Contudo naquele momento mágico todos pareciam se conhecerem a anos. Diva falava com Daniel retirando as coisas do carro, José acompanhou Stéfane que foi abrir um barracão que tinha no lote da casa, Durval falava com o seu Emerson, enquanto que Filomena já estava na cozinha preparando o almoço com a senhora Cida...

            O certo é que a paz e o amor estavam naquele lugar, onde através de um taxista e uma mocinha do interior fez unir aquelas duas famílias.

            - Filomena, cuida da casa que vou dar uma saída com Emerson, pra ver alguns imóveis, já estamos aqui a quase um ano, precisamos do nosso lugar...

            - Vai com Deus homem...

            Filomena parecia não desejar ir embora dali, pois Diva já estava de casamento marcado com Daniel, José já estava na universidade fazendo o curso de medicina, Durval já tinha tirado a carteira de motorista e até fazia meio horário no táxi de Daniel, Emerson já estava aposentando, Stéfane estava na universidade fazendo medicina junto com José, e a dona Cida estava muito doente precisando de ajuda...          

- Calma mamãe, a senhora já teve pior - relatou Stéfane tentando amenizar a dor da mãe, contudo sabendo que o seu casa era irreversível.

            - Você sabe que já não tem jeito pra mim filha...

            - Ainda não sou médica mamãe.

            - Filha, eu sei que logo estará formada e se casará com o doutor José. Esses dias ele me falou que vai voltar pro interior e vai te levar com ele. É verdade filha?

            - Sim mamãe, afinal de conta eu vou me casar com ele, e a obrigação da mulher é seguir o seu marido, e a senhora mesma é testemunha de quanto eu o amo...

            - Mas não fique triste senhora, se for a caso levaremos à senhora conosco - relatou o doutor José que acabava de chegar.

            - Stéfane abraçou o seu noivo e disse:

            - E sei pai, como está?

            - Muito mal, depois da minha formatura parece que piorou, sinto que só espera o nosso casamento...

            Naquele instante a campainha anunciou a chegada de alguém e Stéfane foi atendê-la.

            - É Daniel com Diva e as crianças!

            - Calma crianças, não façam barulho, vovó está doente.

            Durval Júnior e Cidomênia pareciam vir despedir da dona Cida que se esvaia a cada dia...

            - É só esperar à hora não José? - Indagou Diva controlando os filhos para manter um pouco de naturalidade.

            - É Diva, o mesmo ocorre com o nosso velho Durval.

            E assim como frio é o destino que não vem escrito para nós, o doutor José se casou com a doutora Stéfane e foram viver na sua terra natal realizar o sonho do seu falecido pai, que era ter o seu filho doutor.

            - Doutor José, têm cartas pro senhor e para doutora Stéfane...

            - Obrigado Amélia, um minuto, é carta do meu cunhado, chame Stéfane pra mim.

            Minutos depois o doutor José lia a carta de Daniel junto com a sua esposa...

            - Eles estão vindo pra cá amor - relatou Stéfane beijando e marido...

            - Doutor José, tem um senhor muito nervoso aí fora trazendo a sua esposa muito mal.

            - Faça a ficha dela que vou atendê-la.

            - O que que esse doutorzinho acha que ele é, me cobrar o valor da dez vacas pra receitar apenas uma aspirina pra minha mulher...

            Ao ouvir a reclamação o doutor José ordenou a sua secretaria dizendo:

            - Amélia, manda o senhor entrar.

            E quando o rico fazendeiro entrou no consultório do doutor José e exclamou! - é você meu amigo de infância, eu sou Pedro, não se lembra de mim?

            José se levantou da cadeira e deu um forte abraço no amigo e disse:

            - Foram muitos anos que sofri naquela universidade meu amigo, muita saudade, mas hoje sei que o amor da sua vida só precisa de uma aspirina.

 

 FIM

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