sábado, 29 de abril de 2023

A Árvore do Não João Rodrigues

 A ÁRVORE DO NÃO

 

JOÃO RODRIGUES

 

            Esta história é fruto de um acaso quando por acaso eu visitei uma penitenciária com um amigo missionário. De sorte que conheci um presidiário que me contou o que tinha lhe acontecido para que fosse condenado a quatrocentos anos de reclusão.

            Contudo quero dizer que o que vou dizer foi o que ele me disse:

            - Pois é seu Escritor, sei que me entendi por gente quando eu tinha uns cinco anos aproximadamente. Meu pai era um homem muito pobre e tinha muito orgulho de me ter como filho único, pelo menos era o que ele dizia. A minha mãe, coitada, essa vivia sob os pensamentos do meu pai, era daquelas mulheres que são capazes de até morrer de fome, mas não têm coragem de separar do marido miserável, dizem que vivem presas naquela lorota de que o que Deus uniu o homem não separa coisa idiota, eu acho idiotice uma mulher se deitar na cama com um desgraçado que até deixa a coitada passar fome. E depois diz aquela coisa de otários, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, até que essa coisa de doença não é muita cafona, que ninguém sabe a hora que a tal doença chega, mas a de na riqueza e na pobreza, essa eu nunca consegui entender.

            - Mas o que aconteceu?

            - Calma senhor, temos um caminho longo pela frente. Pois bem, fui crescendo e assistindo aquela vida miserável, nem mesmo material para estudar um tinha. Mesmo assim eu ia, ia para às vezes filar algum bocado de sobras de merenda de algum aluno, pois nem mesmo a escola servia uma merenda decente. Dizem que o prefeito desviava o dinheiro e mandava servir qualquer coisa para gente, e isso eu acho que era mesmo verdade, pois ele andava de carro novo, era o melhor da cidade e isso ele sabia fazer com perfeição, roubar, pois desde quando eu entendi por gente ele já era prefeito e mesmo depois que sai de lá ele ainda era prefeito. A outra coisa que me fazia ir àquela escola era uma linda menina eu desde o primeiro dia que fui ali fiquei encantado por ela. Linda! A linda Isabel.

            - O que sentia por ela?

            - Não sei bem o que era, mas acho ser o tal do amor, esse amor ai que as pessoas dizem.     - Você a amava?

            - E como meu senhor, era a coisa mais importante da minha vida, talvez eu tolerasse aquela vida desgraçada por causa dela. De modo que fui crescendo assim comecei procurar trabalho. Ganhava muito pouco, pois os aproveitadores diziam que eu tinha que receber pouco por ser menor de idade, nunca consegui entender tal coisa, pois que diferença fazia, uma vez que eu fazia o mesmo trabalho que fazia um de maior. O pior é que quando fui aproximando dos meus dezoito anos, ao invés de facilitar, foi que ficou ainda mais difícil de conseguir trabalho, pois diziam que só depois de eu servir o exército. De maneira que aquilo ficou em minha mente, tudo parado na minha vida. E eu contava os dias para ir servir o tal exército.

            - E foi?

            - Ir eu fui, fui com grande alegria em meu coração, agora eu já tinha meus dezoito anos, agora eu podia servir ao meu país, agora eu ia ser um homem de verdade. E lá estava eu, longe de casa, com muita saudade do meu pai e minha mãe, e por que não dizer, da linda Isabel que continuava em meu coração, apesar de não saber que eu a amava de verdade, mas era a minha amiga de escola.

            - Mas, nunca foi namorado dela?

            - Não, éramos amigos, colegas de escola. Eu também não tinha nada a oferecer a ela, pois sou contra uma mulher se deitar na cama com um homem e passar fome com ele, eu jamais faria isso com a filha de alguém. Eu esperava arrumar um pé de meia para poder dar a ela uma vida confortável e assim sermos felizes para sempre. Não com luxo e desonestidade, uma vida com fartura e vivendo dentro da lei dos homens e de Deus.

            - E o que sucedeu no exército?

            - Foi uma das coisas mais triste em minha vida quando eu ouvia a chamada, e que aquele coronel que parecia um gafanhoto com aquela farda verde e coberto de estrelas e medalhas e com um semblante de superioridade falou o meu nome:

            - Rogério da Silva Couto.

            - Respondi me sentindo um general, foi quando aquele maldito disse:

            - Você foi dispensado...

            - Aquilo foi como um frio punhal perfurando o meu ser e todas as minhas esperanças de ser alguém. Senti-me inferior, pois o meu país não se interessou em mim, fui dispensado, descartado, excluído.      

- E o que sucedeu?

            - Voltei para minha pequena cidade, fui muito bem recebido por minha mãe e meu pai, ficaram felizes com a minha volta, até parecia que estavam torcendo para que o exército me dispensar, por um lado parecia que precisavam de mim, tinham medo da velhice, eu era o único ser humano que eles podiam contar, de certa forma tinham razão, fui eu que Deus lhes concedeu como filho, portanto eu tinha que respeitar o pensamento deles.

            - E quanto a Isabel? Foi ao seu encontro?

            - Não, só a encontrei na praça da cidade naquele fim de semana, o primeiro fim de semana depois que fui dispensado pelo exército.

            - E foi bem com ela no encontro ou já não a amava mais?

            - Não me continha de vontade de me encontrar com ela e dizer que eu tinha voltado para cidade e que agora já livre daquela coisa chamada exército eu podia arrumar um trabalho e com isso assumir que eu a amava verdadeiramente, e assim, quem sabe, até me casar com ela.

            De modo que ele falava e parou inesperadamente com uma mudança estranha no seu semblante, foi aí que perguntei?

            - Algum problema Rogério?

            - É duro me lembrar daquele momento senhor, sei que a praça estava cheia de lindas garotas que passeavam naquele jardim iluminado naquela noite de alegria. Fiquei observando quantas eram e como eram lindas, lindas, mas não chegavam à beleza da linda Isabel que a me ver ali teve a delicadeza de me cumprimentar dizendo:

            - Rogério! Fiquei sabendo que o exército te dispensou!

            - Fiquei por um instante contemplando a sua beleza e ela continuou dizendo:

            - O que foi! Ficou diferente, nem parece ser mais o mesmo que Rogério que conheço desde criança?

            - Olhei firmemente nos olhos dela e relatei:

            - Isabel, linda Isabel, posso passear um pouco com você?

            - O que está acontecendo Rogério? Tem algo diferente em você.

            - Nada Isabel, eu só que te falar que voltei com a intenção de me firmar aqui, pois aqui é o meu lugar, e já que o exército me dispensou, agora estou livre para fazer o que quero da vinha vida.

            - E o que você quer?  Rogério?

            - Quero você Isabel.

            - Por um instante ela ficou olhando para mim e disse:

            - Vamos nos assentar nesse bando.

            - Assim nos assentamos ali e ela foi logo dizendo:

            - Poderia me repetir o que disse?

            - Sim Isabel, que me casar com você.

            - Casar comigo! Não somos nem namorados! E você vem falando de casamento, o que é isso Rogério, ti tenho como irmão, somos amigos desde então, não Rogério, eu não posso me casar com você, eu não te amo desta forma, o meu amor por você é um amor de amigo, nunca te amei como uma moça pudesse amar um rapaz pensando em casamento, não quero você Rogério. Não, não quero...

            - Sei que ela falou a palavra não por várias vezes ao ponto de fez algo dentro de mim se aflorar. Senti como se eu fosse uma enorme árvore e os meus pés como tronco, os meus braços como galhos, foi que num momento terrível e incontrolável eu estrangulei a minha linda Isabel lá naquele banco da praça, lá naquela cidade eu matei o meu amor, quero dizer, a árvore do não que nasceu dentro de mim acabou por me fazer matar a única pessoa que eu amei, se for que existe o amor, eu a amei de verdade.

            - E você fugiu da praça na hora que você, quer dizer que a árvore de não que se apoderou de você e te fez matar a linda Isabel?

            - Não, não fugi, fiquei ali a olhar o corpo dela, da minha linda Isabel sobre aquele banco, e quando a árvore do não se distanciou de mim eu queria voltar atrás e nunca ter voltado àquela cidade, eu queria chorar, mas assustado por ver em minha frente uma pessoa morta, não chorei, só sei que ouvi como se fosse de uma outra dimensão uma voz dizendo:

            - O senhor está preso, tem o direito de...  Aquela xaropada da polícia que o senhor é ciente. Fui andando algemado e uma multidão de pessoas gritava:

            - Lincha, lincha, lincha.

            - Mesmo depois de preso a multidão não parava de gritar:

            - Lincha, lincha, lincha...

            - Foi ai que olhei pras grades daquela prisão e a árvore de não volto a se apoderar de mim, quando me dei conta já tinha quebrado aquelas grades e sai na praça em frente à cadeia atirando pedaços de ferro naquela gente que clamava por justiça sumária.

            - E como isso parou?

            - Parou com um tiro do fuzil em minha perna, mesmo assim eu já tinha matado mais de vinte pessoas, foi à coisa mais triste que o meu ser viveu quando aquela bala de fuzil deixou o grande estrago a minha perna, seu que foi uma sensação estranha.

            - Estranha como? Que tipo de estranheza?

            - Não sei, não tenho palavras para definir o que senti, sei que foi terrível, é como se fosse você vendo o seu fim, uma sensação de invalidez.

            - E ainda sentia a árvore do não em seu ser?

            - Não, parece que depois do tiro ela se foi com a fumaça da pólvora. De modo que fiquei olhando aquelas pessoas que me olhavam como se tivessem me vencido. Naquele momento eu tenho a ligeira impressão de que chorei.

            - Por que ligeira impressão?

            - Não sei, só sei que acordei uns dois anos depois numa cama de hospital.

Ah como foi gostoso abrir os meus olhos e ver que eu estava vivo não sei por que eu estava sozinho naquele lugar, como era lindo o quarto, se que quando ia me levantado ouvi uma suave voz que disse:

            - Seja bem-vindo, Rogério.

            - Me alegrei ao ver os lindos olhos azuis daquela enfermeira.

            - Quanto tempo eu estou aqui?

            - Quando cheguei nesse hospital você já se encontrava aqui, mas pela sua ficha hoje está completando exatamente dois anos e quatro meses.

            - Como se chama enfermeira?

            - Tenente Carla.

            - Quando ela falou que era tenente foi que pude notar as divisas que identificavam o seu posto. Fiquei por algum tempo olhando para ela e delicadamente pedi a ela pra se deitar comigo.

            - Assim ela te disse não?

            - Sim, foi ai que vi que a tal árvore começava a se manifestar, de modo que eu gritei:

            - Fuja tenente, fuja!

            - E ela fugiu?

            - Não, não deu tempo, sei que a violentei e depois a estrangulei sobre aquela cama onde ela cuidava de mim.

            - Assim acabou fugindo do hospital?

            - Não, não acabou ai, quando o meu ser enlouquecido ao ver aquela mulher morta em minha frente depois de ter me dado uma sensação que nunca tinha conhecido, pois até aquele dia eu não tinha conhecido uma mulher, ela foi à primeira, na verdade o meu desejo era que Isabel fosse à primeira, mas deu no que deu, e eu perdi a minha linda Isabel que era o meu desejo íntimo, pois desde criança eu sempre me guardei para ela pensando no dia do nosso casamento que nem mesmo ela sabia. 

            - E assim se arrependeu do que fez?

            - Como eu ia me arrepender, uma vez que não era eu que fazia aquilo, e sim a árvore do não.

            - Sim, compreendo, pode continuar.

            - Pois é, quando eu olhava o corpo dela, o quarto foi invadido por vários policiais e acabei jogando todos eles pela janela. Depois fiquei por algum tempo contemplando os corpos deles estendidos no chão, estavam indefesos, mortos, estavam sem vida. Parece que naquela hora a árvore de não se foi para sempre. Até chego a pensar que era alguma coisa do mal que se apoderava de mim Para fazer algo que parecia ser regido por uma força maior.

            - E o que você fez a partir daí?

            - Me senti sozinho, desamparado e arrependido por tudo que aconteceu, ainda quase sem roupas eu saí andando pelo hospital e logo a polícia me conduziu para um presídio de segurança máxima. O certo é que não demorou muito o meu julgamento, lá não apareceu ninguém a meu favor, só mesmo um advogado que o estado me designou por exigência da lei, até mesmo ele dava a entender que desejava a minha condenação.

            - Mas você não disse para o juiz sobre a árvore do não?

            - Não, achei que não valia a pena relatar o nome de uma coisa tão estranha que me fez perder a minha vida e matar toda aquela gente, fui triste quando ouvi o juiz dizer:

            - Rogério Silva Couto, ponha-se de pé para ouvir a sua sentença, este tribunal decidiu te condenar a quatrocentos anos de reclusão.

            - Daí. Eu vim pra cá, onde estou cumprindo a minha pena.

                                    

FIM

 

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