terça-feira, 2 de maio de 2023

Uma Noite Escura João Rodrigues

 

UMA NOITE ESCURA

 

JOÃO RODRIGUES

 

            Dois inseparáveis amigos dividiam as suas tarefas diárias às margens do Rio Carinhanha. E no dia 20 de abril de 1953, eles seguiam na escuridão da noite, remando suavemente a canoa que se deslizava sobre as águas do rio.

            - Você por acaso não escutou uma explosão Bambé?

             - Claro que escutei Chico?

            - Vamos ver o que foi? O que aconteceu lá em cima?

            - Vamos sô. A curiosidade está me matando. Vamos lá...

            - Não acha melhor a gente esperar o dia clarear?

            - Você ficou doido Chico. O dia vai demorar muito para clarear.

            - Então vamos assim mesmo, na escuridão.

            - Vamos. Os peixes não estão a favor da gente mesmo.

             - Podemos armar a rede!

            - Então vamos fazer isso.

            - Quem sabe quando a gente voltar, ela vai estar cheias deles.

            - Fala baixo que se não os danados vão embora. Eles ficam aí dentro da água só na escuta.

            - Ué Chico! Eu não sabia que peixe  escuta e sabe o que a gente fala.

             - Por isso mesmo.

            - Não entendi!

            - É muito fácil de entender as coisas quando a gente quer e deseja entender as coisas.

            - Continuei sem saber. Desse jeito estranho. Mesmo assim do jeito que você está querendo que eu possa entender.

            - Vamos deixar isso pra lá!

            - Sabe de uma coisa Chico!

            - Esses peixes, os danados podem estar a essas horas muito longe daqui. Esses bichos são danados.

            - O que lhe faz pensar assim Bambé?

            - Eu e Anastácia ficamos certo dia pra muito tempo observando os movimentos dos peixes. Eles iam, iam abanando os rabinhos.

            - E daí! O que tem a ver uma coisa com a outra?

            - Tem sô. Nós ficamos por muito tempo esperando que eles voltassem.

            - E eles voltaram?

            - Foi como lhe disse. Demorou um tempão.

            - Já amarrou a rede aí?

            - Tudo em ordem Chico.

            - Então vamos subir lá no paredão e ver lá do alto se tem algum sinal da explosão.

            - Vai ser muito difícil andar nessa ladeira nessa noite escura!

            - Vai ser mesmo.

            - Oh Chico!

            - Diz homem o que você quer!

            - Você é capaz de se lembrar agora há quantos anos a gente se conhece?

            - Ué como não! Foi aquele que não posso esquecer. A noite viva da minha grande alegria. Lá na inesquecível casa do velho Lúcio. E eu fui o motivo vivo do senhor ter encontrado a comadre Anastácia dançando em meus braços.

            - Foi mesmo. E se lembra o vestido que ela vestia?

            - Lembro! Aquela chita está até hoje misturada com o som da sanfona dentro do meu pensamento.

            - Você falando assim, até me dá saudades daquele tempo. Bem que eu gostaria que ele voltasse.

            - Não volta seu Bambé. O que passou, passou!

            - É Chico. Eu entendo.

            - Esta vida é uma grande surpresa, e nos traz grandes mistérios.

            - Como mistérios!

             - E o maior mistério da vida é a gente.

            - Não entendi o que você quer dizer!

            - Está vendo só! Aí está!

            - Está o quê?

            - O mistério. Nós somos o mistério. Nós não nos entendemos nem a nós mesmos. Nem mesmo o que falamos ou ouvimos. Porém de certa forma nem mesmo sabemos muitas vezes o que queremos ou pretendemos querer.

            - Pode parar aí Chico! Você está querendo me enlouquecer!

            - Viu só o que você acabou de dizer!

            - Loucura. Esta coisa é a pior peste que Deus deixou para o homem.

            - Você fala coisa sem pensar Chico. Não mete Deus nessa conversa. Pois ele não tem nada a ver com a gente. Ele não tem nada com isso. Acho melhor deixar Deus de fora dessa.

            - Deixar Deus de fora dessa. Por quê? O senhor não sabe que está escrito na palavra de Deus que as coisas de Deus são como loucura para o mundo!

            - Não sei porque loucura. Vejo só. Deus  criou o mundo e todas as coisas que nele existe.

            - Isso. Incluindo a gente!

            - Pois é! Daí a certeza de que Ele não tem nenhuma intenção de trazer até a gente esta peste que você acabou de dizer.

            - De certa forma não. Porém se a gente  pensar  bem  nas  coisas  é  muito complicado.

            - Complicada! Como assim! Esta complicação?

            - Vou lhe dar um exemplo a esse respeito. Quero junto com o senhor, voltarmos naquele dia que conhecemos a comadre Anastácia na festa da casa do seu Lúcio. Que Deus tenha dado um bom lugar a ele.

            - Esqueça o resto. Continua o seu raciocínio Chico?

            - Sim Bambé. Vou continuar. Como eu falava. Que a partir daquele dia a minha vida mudou?

            - Sua vida! Como assim?

            - Eu estava dançando com a comadre Anastácia. Mergulhado no som da sanfona.

Sentia-me um prisioneiro em seus braços. Aí foi quando ouvi a voz que me falou de maneira estranha. Voz essa que a partir daquele dia nunca mais separou de mim...

            - Não sei se fiz errado Chico. Porém

ao meu entender era o que eu tinha de

fazer.

            - Não sei por que toquei nesse

assunto. Agora depois de tantos anos, fazer o que!

            - Na verdade Chico, nós nunca falamos nisso. Hoje por esta oportunidade, quero perguntar ao senhor uma coisa!

            - O que quer perguntar?

            - O senhor estava dançando com Anastácia. E quando eu a pedi para dançar, não nos conhecíamos. Nem eu a conhecia e nem o senhor. E acho que  o senhor também não a conhecia. Assim como não conhecia também a mim.

            - E onde o senhor está querendo chegar?

            - Se por acaso eu não tivesse pedido ao senhor a Anastácia para dançar! O que teria acontecido?

            - Eu não tenho como imaginar o que poderia ter acontecido.

            - Pode dizer Chico! Diz o que quer dizer. Solte o que está te magoando!

            - Não posso seu Bambé! Não posso.

            - Deixa de ser durão meu amigo! Fale!

            - Não posso. Jurei a mim mesmo que nunca falaria isso!

            - Ué Chico! Pensei que o senhor sentia alguma coisa a respeito daquele dia. Porem não assim tão acentuado.

            - Não é nada não seu Bambé? Esse é um problema exclusivamente meu.

            - Então sendo assim, o senhor está me escondendo alguma coisa!

            - Isso pra mim já não importa. Eu já perdi a minha vida mesmo. O resto que se dane!

            - Assim a coisa está ficando cada vez pior. O que está acontecendo?

            - À noite seu Bambé! A noite escura. Esta madrugada escura pode ser a mais triste de minha vida.   

            - Estou notando que você está com a voz mudada Chico! O que está acontecendo?

            - Não chega perto de mim seu Bambé! Vai embora. O meu dia chegou.

            - Não estou entendendo Chico! Fale comigo. Que cheiro horrível é esse? Sai de dentro dessa macambira. Você não é um bicho!

             - Vai embora seu Bambé! Pelo amor de Deus.

            - Não vou sair daqui enquanto não saber o que está acontecendo.

            - Vai embora seu Bambé! Vai embora. Eu não quero te matar...

            Agora estava o pobre Bambé, diante de uma coisa que nem mesmo podia ver o que era. Pois a escuridão não deixava os seus simples olhos de humano ver no que tinha virado o seu inseparável amigo.           

            - Eu não sei que coisa você é agora Chico! Porém se quiser me matar que me mate. Está muito escuro, eu não posso te ver. Não sei que coisa é você.

Fale comigo o que você quer de mim. Fale sua coisa do inferno...

             Bambé se sentia como um verdadeiro guerreiro. E de posse de um pequeno facão em suas mãos gritou:

            - Decida o que quer Chico! Vamos seus desgraçados. Quer lutar? Lute comigo. Se você sabia que era um monstro todo esse tempo, por que se escondeu atrás de um sorriso! Para que? Hem seu desgraçado. Se você for homem  me  responda  de  que  inferno  você veio?

            De modo que Bambé tentava descobrir o que estava verdadeiramente acontecendo. E num mudo e triste momento o monstro não falava mais...

             - Apareça coisa do inferno. Sai daí...

            - Rummmm innn muaaaaa grau grau...

            Foi assim com essa linguagem estranha que  a vida de um homem se foi. E nem mesmo armado com o seu facão pode deter a coisa que nasceu de alguém que viveu do seu lado e compartilhava das suas alegrias e tristezas... Chico agora era um monstro que com o seu grito aterrorizador, deixava ali naquela ladeira a margem do Rio Carinhanha, os restos mortais de Bambé. Tudo isso não teria talvez acontecido se não fosse a curiosidade de querer saber  o  que  havia explodido lá numa noite escura do sertão. E Chico que agora era um monstro, seguiu o seu caminho maldito à procura de mais uma vitima. Assim naquela noite escura, deixava o seu rastro de destruição. Enquanto isso. Lá na casa de Bambé, o vento quente do sertão fazia bater as portas e janelas, A pobre Anastácia chamava desesperada o seu filho:

            - Mateus, acorde meu filho!

             - Aconteceu alguma coisa estranha mãe?

            - Sim Filho. Pegue o seu cavalo e vai até Carinhanha avisar ao Sargento Rodrigues levar um recado para mim.

            - A noite está muito escura mamãe. Estou com medo.

             - Não tenha medo Mateus...

Mateus se levantou e foi a roça apanhar o seu cavalo e quando voltou:

            - Mamãe! Que vento estranho é esse?

            - Vá a cidade filho e diz para o Sargento Rodrigues...

            Com o barulho do vento Mateus não conseguiu entender o que  a sua mãe dizia:

            - Que devo dizer ao Sargento Rodrigues mamãe?

            - Diz para ele que chegou o dia!

            - Que dia mamãe!

            - Fala isso que sabe!

            Mateus montou em seu cavalo e saiu na disparada...

            - Não tenha medo conhaque. Nós vamos conseguir encontrar o caminho nessa escuridão coberta de ventania. O cavalo conhaque corria pelo escuro caminho como se soubesse o que estava acontecendo...

            - Sinto algo errado conhaque...

            E naquele lugar infernal, hoje conhecido como pequizeiro de visagem, o pobre Mateus ficou espetado nos galhos pontiagudos no meio do caminho. O relincho do cavalo conhaque parecia avisar o sertão que o seu dono e amigo Mateus tinha morrido. Contudo o cavalo conhaque continuou a viagem e foi para em frente à casa do Sargento Rodrigues.

            - Sargento! Sargento!

            - Quem pode estar me incomodando há essas horas!

            E quando o Sargento Rodrigues abriu a porta. Sentiu o horrível cheiro que  o  maldito  vento  quente  do  sertão  assoprava  naquela noite escura. Trazendo consigo o cheiro da morte.

            - Sargento! O senhor está sentindo?

            - Está Zé. Estou sentindo o vento da morte.

            - Pois é Sargento. O cavalo de Mateus chegou todo ensangüentado.

            - Então avisa o pessoal. Vamos ver se a gente consegue salvar Anastácia.

            Tudo não passava de uma armação diabólica que o Sargento Rodrigues tinha com mais algumas pessoas naquela maldita cidade lá nos confins do sertão.

             - Bate Papo! Ou Bate Papo!

            Na escuridão uma porta se abriu e uma voz tremula disse:

            - Zé! Fala baixo moço. Não devemos incomodar ninguém...

            - Você já está sabendo?

            - Ouvi o cavalo de Mateus relinchando quando entrou na cidade.

            - O Sargento disse que temos que nos apressar para ver se conseguimos salvar Anastácia.

            - Vou me arrumar Zé! Vai chamar Malasart, que nos encontraremos lá na saída da cidade.

Quando Zé Padeiro chegou na casa de Malasart o Sargento Rodrigues já estava  lá.

            - E o Bate Papo, Zé?

            - Está nos esperando na saída da cidade.

            - Então vamos. Não temos tempo a perder...

            - Sargento! Sinto medo deste cavalo!

            - Não é preciso ter medo Zé. Ele é um dos nossos!

            - Conhaque é um humano!

            - Não seu imbecil. E quem disse que somos humanos...

            - Ué Sargento! Seu que vimos no mundo diferente dele.

            - E que diferença tem entre um humano e um cavalo!

            - Não posso discordar do senhor Sargento.

            - Pois é. Nota-se também que certas mulheres não passam de verdadeiras mulas, éguas, pacas, vacas, uma jumenta.

            - Porém, mesmo assim ainda é uma mulher Sargento.

            - Por que está dizendo isso  Malasart?

            - Não é nada não Sargento. Eu só estava querendo participar do papo.

            - Está bem. Vamos...

            De modo que os quatros reunidos na saída da cidade...

            - Sargento?

            - Fala Bate Papo.

            - Apanhou o livro?

            - Apanhei.

            - Malasart!  

            - Estou com a espada Bate Papo.

            - Ótimo.

            - Vejo que todos estão preparados para a grande batalha  relatou o Sargento Rodrigues.

            E naquela noite escura eles seguiam em direção a casa de Anastácia:

            - Sargento! O senhor acha que só falta este?  - indagou Zé Padeiro.   

- É. Só falta ele Zé...

            - Eu já penso diferente Sargento.

            - Por que razão Bate Papo?

            - Foram doze os condenados.

            - Pois então. Onze já se desfizeram do seu tempo.

            - O Sargento tem razão Bate Papo. Chico é o último condenado  argumentou Zé Padeiro.

            - Então é ele que tem de ser fera por mil anos?

            - Isso mesmo  afirmou o Sargento Rodrigues acrescentando:

            - Por isso ele não se casou!

            - Eu sei que sou um membro dessa louca organização. Na entanto não tive ainda o privilégio de saber aonde foi parar os onze. Pode me responder Sargento?

            O Sargento Rodrigues ficou em silêncio por algum tempo e em seguida falou:

            - Conhaque é um deles Malasart!

            - Era uma linda mulher  argumentou Bate Papo.

            - Como pôde uma linda mulher se transformar em um simples cavalo!

            - Pôde Malasart. O pior foi Alípio que virou um peixe  informou Bate Papo dizendo:

            - Ele era muito farrista. Eu até recordo quando colocamos fogo na canoa. Se lembra Sargento?

            - Como eu iria esquecer. Foi naquele dia que conheci a minha mulher.

            - Ela foi a sua recompensa pelo seu trabalho.

             E um estranho som surgiu no meio da escuridão!

            - Escutou o som Sargento?

            O silêncio recebeu a voz de Zé Padeiro. Minutos depois o Sargento Rodrigues limpou a sua garganta e disse:

            - É a vitória de Perfume.

            - E o que é isso Sargento?

            - É a fera que Chico se transformou.

            - E por mil anos ele será fera  - argumentou Bate Papo sentindo-se feliz.            - Bate Papo. Eu posso fazer uma pergunta?

            - Pode Malasart.   

            - É o seguinte, quem por acaso começou tudo isso?

            - Esta resposta ele não pode dar Malasart - interrompeu o Sargento Rodrigues argumentando:

            - No primeiro capítulo do livro está escrito que ninguém poderá saber como começou a história que durará na terra por mil anos.

            - Por isso é que Perfume terá de ser fera por todo esse tempo Sargento?

             - Isso mesmo Malasart.

            - Não podemos esquecer que Conhaque também faz parte desta família. Esta linda família da escuridão - argumentou Bate Papo.

            - Como pode um cavalo durar mil anos!  - exclamou Zé Padeiro.

            - Tenha Calma Zé. No segundo capitulo do livro diz que de tempo em tempo haverá uma perseguição de um missionário que virá em nome de Jesus Cristo, para acabar com a maldição que foi lançada.

            - E ele conseguirá Sargento? - indagou Malasart aflito e curioso.

            - Se vai conseguir não sabemos. Porém no capitulo quatro diz que o poder de Jesus Cristo é incomparável a qualquer outro poder.

            - Que legal! E porque estamos nessa?

            - Não entendi Malasart.

            - Não entendeu como Sargento!

            - Essa sua exclamação.

            - Sobre o nome de Jesus Cristo?

            - Sim. Você bem sabe que não estamos com Ele. Ele é a luz e nos somos a escuridão.

            - E que vantagem estamos tendo com isso?

            - Isso o que Malasart?

            - Isso de escuridão. De maldição. Tem noite que nem mesmo consigo dormir direito. Sinto como se um sino estivesse badalando na minha mente!

            - Ué! Isso é que é o gostoso da nossa organização. A gente escutar criança chorar, sino tocar, gritos de horror, lamentações. Isso é maravilho.

            - Pessoas em apuros pedindo pelo amor de Deus  interrompeu Bate Papo, sorrindo.

            -  Não sinto bem com isso Sargento. Só estou nessa porque  ganhei aquele presente de mulher. Mesmo que Ada era a mais bonita e formosa entre todos que deixaram a minha escolha.

            - Então Malasart. Depois que deflorou vinte garotas e escolheu a sua casa com o direito de viver nela pelo resto da sua vida com a virgem que você escolheu. Agora está pensando em mudar de idéia!

            - Não é bem assim Sargento! Não sou nenhum imbecil. Sei que tudo tem o seu preço. Contudo posso afirmar que na situação que eu vivia naquela ocasião me reservava o direito de optar por qualquer coisa.

            - Está querendo dizer que a nossa organização é qualquer coisa! Você pode ser punido por isso. Por desrespeito a nossa imagem.

             - Não estou preocupado com isso Sargento. O que eu queria mesmo era me libertar. Tirar de dentro de mim tantos pesadelos. Sabe Sargento, às vezes eu ainda escuto quando durmo, os gritos daquelas virgens quando eu as violentava. Não sei porque fiz tudo aquilo. Parece que vocês sabiam que isso iria  me  acompanhar  como  uma  sombra num dia de sol, ou numa noite de luar. Ou mesmo assim quando eu passasse por qualquer luz. Portando Sargento, às vezes eu me sinto melhor quando estou recôndito na escuridão. Para que eu não veja esta sombra maldita seguindo os meus passos.

            - Ué Malasart. Você não sabe mesmo apreciar o que é bom. A sensação de ter algo terrível ao nosso lado  interrompeu Bate Papo.

            - Pode ser para você Bate Papo. Porém para mim acabou.

            - Por que não suicida Malasart? - indagou Zé Padeiro sorrindo.

            - Até que já passou pela minha mente essa idéia. No entanto eu acho que eu não tenho esse direito. Tirar a minha própria vida. Não Zé. Eu não tenho esse direito.

            - Concordo com você Malasart - argumentou o Sargento Rodrigues, acrescentando:

            - O suicídio é uma coisa muito pesada. Acho que ninguém por mais desesperado que estiver deve recorrer ao suicídio. Isso é uma coisa nojenta. 

            - Já eu acho legal - interrompeu Zé Padeiro.

            - Você pode achar Zé. Eu prefiro ficar dizer que ninguém deve fazer isso  relatou o Sargento Rodrigues.

            - Não estou aqui para criar confusão Sargento. Só que notei como ficou o pobre Malasart.  Com isso só fui dar uma idéia para tentar aliviar o que o coitado está sentindo.

            - Não! Chega pra lá sua coisa do inferno. Chega pra lá...

            - O que foi. O que está acontecendo Bate Papo? O que aconteceu?  O que você está vendo?              

Bate Papo não pôde responder ao Sargento Rodrigues. Pois uma coisa horrível. Num golpe incomparável, já tinha lhe cortado à garganta lá no meio da escuridão. E o som fúnebre levou consigo o pobre Bate Papo.

            - Você já o matou Perfume. Agora vá seu maldito. Ele era um dos nossos! Por que fez Isso? Hem seu idiota.

            De modo que o monstro perfume se foi. Atendendo assim a ordem do Sargento Rodrigues.

            - Sargento? Com que arma combate esta coisa infernal?

            - No capitulo sexto do livro diz que o tal missionário se estiver em dia com todos os seus compromissos com a igreja,  este sim, poderá derrotar o Perfume, o Conhaque, o Jejo, a Gertrudes, seus dois filhos de um olho só, Corisco e Trovão, a sedutora de escuridão, Brilhantina, o seu namorado mágico, Alcanfor, o Cavaleiro da escuridão chamado Taca, o seu irmão, o Toureiro Pano Leve, a cobra voadora chamada Gina, e finalmente o pior de todos o temido e poderoso profeta da escuridão, Miron.

            - E todos esses que o senhor falou ainda estão vivos ou só o Perfume.

            - Se só o Perfume! Você se esqueceu que está montado em um!

            - Esse é manso.

            - Manso! É bom você pensar assim!

            - Sargento!

            - O que é Malasart?

            - Essa espada! O que faço com ela?

            - É para a batalha!

             - Acho que não vai ter nenhuma serventia?

            - Por quê?

            - O senhor não sentiu, não viu, estava cego ou não quis ver? Ele nem mesmo deu ao pobre Bate Papo à condição de se defender. Eu com esta espada na mão. Não pude fazer nada. Não por falta de coragem. Foi porque não deu tempo.

            - Você não sabe o poder que tem essa espada Malasart.

            - Eu nunca pensei Sargento, que eu fosse um dia passar por essa coisa assim tão imbecil.

            - Imbecil como Zé?

            - Sim Sargento. Essa organização sem nome, sem fundamento, sem talvez objetivo.  Sem nada.  Eu por exemplo, pouco  sei  dessa coisa. E agora vejo um colega simplesmente ser devorado sem nenhuma defesa.

            - Devia ter alguma defesa?

            - Claro que sim Sargento. Sinto-me como um otário desprotegido. Sou um despreparado, desinformado, nada posso saber antes de acontecer alguma coisa. Eu sou o que?

            - Não é obrigado ficar na organização me amigo. Fica se quiser. O caminho está livre.

            De modo que a situação era essa. O Sargento Rodrigues na verdade parecia ser a única cabeça da maldita organização. Que de certa forma parecia ser existente há muito tempo.

            - O senhor quer que eu vá ou está apenas me sugerindo Sargento?

            - Nem uma coisa nem outra. Eu só quero dizer que não é permitido questionamento em nosso meio.

            - E por qual o motivo?

            - A cobra voadora não permite.

            - Que cobra voadora que nada Sargento. Eu já estou mesmo é desistindo desta coisa idiota.

            Malasart estava de certa forma muito assustado com tudo aquilo. Ele na verdade não tinha ainda a permissão de saber tudo a respeito da brutal organização. Que parecia ser simplesmente fruto da imaginação do Sargento Rodrigues. Demonstrava que ele tinha inventado tudo aquilo. Porém ao mesmo tempo não tinha certeza se foi ele ou se ele herdou do seu passado. Era uma coisa que não estava no seu domínio. Pois ele até dizia:

            - Acho  que  fui  eu  que  inventei  tudo

 isso, e ao mesmo tempo não sei. Sei que entrei nela sem sentir. E hoje tudo indica que sou o chefe. Sei que não sou um humano! Contudo ao mesmo tempo pareço ser.

            De maneira que nessa duvida infernal o Sargento Rodrigues era o próprio representante do inferno na terra. Pois com a sua voz de covarde dizia:

            - Isso não importa. O que importa mesmo é ir em frente.

            Dava para notar na expressão do Sargento Rodrigues existia algo inexplicável...

            - Sargento! Sinto que o senhor está triste.

            - Sim Zé. A tristeza para nós é como se fosse um consolo. Um consolo, uma alivio para os nossos pesadelos que nunca chegam ao fim.

            - Tudo porque pertencemos ao inferno!  - exclamou Malasart.

            - Sim Malasart. Somos filhos da escuridão. Vivemos como humanos, no entanto não somos. Temos a corpo de humanos, contudo nem mesmo temos o privilégio de um dia sermos humanos  e isso  dói em mim!

            - E porque somos assim?

            - Que ordem desgraçada é essa? Que nem mesmo a gente tem o direito de saber! Hem! Sargento! - exclamou Zé Padeiro com ar de muita tristeza.

            - Até você Zé. Muito me admiro.

            E os três infernais de Carinhanha, seguiam estrada afora ruma a casa de Anastácia, com o intuito de salva-la da morte.

            - Por que temos de salvar Anastácia?

            - Pelo que está escrito no livro. Somos obrigados a proteger esta mulher. Pois ela e muitas outras são as responsáveis de dar a luz aos nossos filhos que ficaram assim como metade humano, e metade demônio.

            Naquele momento um horrível som passou como um relâmpago e Zé Padeiro falaram:

            - O que foi isso Sargento?

            - Gina, a cobra voadora que veio buscar Malasart. Ele estava muito indeciso e isso não é permitido no nosso meio.

            Zé Padeiro ficou muito triste e assustado com a rapidez que Gina levou o pobre Malasart. E depois de algum tempo em silêncio ele disse:

            - Maldita. Ela nem deu chance ao coitado de se defender.

            - Que tipo de você gostaria que ele tivesse Zé?

            - Ué Sargento. Sei lá. De se defender. Ou não temos esse direito?

            - Direito! Que bobeira é essa Zé. Na escuridão não existe isso. Na escuridão não há volta. É como se fosse uma estrada que segue pelo pântano. É uma trilha sem volta. Pois quanto mais mexemos mais nos afundamos.

            - Que mundo infernal eu me meti Sargento...

            - Zé. Apanhe a espada, que logo estaremos na casa de Anastácia. Vai ser dura a guerra.

            - Como vou encontrar a espada nessa escuridão Sargento.

            - Repita três palavras comigo.

            - Estou ouvindo Sargento.

            - Luz da escuridão, olhos da serpente, espada fulminante.

            Quando Zé Padeiro repetiu as  três  palavras  um  grande  clarão  surgiu  de  maneira mágica e ele viu a espada no chão.

             - Incrível. Como isso é incrível!

            - Você é um cara muito humilde Zé. Por isso é que teve o privilégio de conhecer um pouco da nossa organização.

            - Conquistei este direito? Como foi? Ou foi só agora?

            - Tudo no poder das trevas é maravilhoso Zé. Tudo é inacreditável, Tudo é um lindo barato. Tudo é fantástico.

            - Sargento!

            - Diz Zé!

            - Será que o meu fim vai ser assim de uma forma tão inexplicável?

             - Como inexplicável?

            - Sim Sargento. Eles morreram assim sem mais nem menos. Não tiveram nem mesmo direito à defesa. Sinto que a vida de gente como nós é como se fosse como uma velha moeda que só tem valor de um lado e assim mesmo se for atual. Pois se passar o seu tempo fica jogada no fundo do baú de alguém a espera do não sabe o que.

            - Não sofra com a sua filosofia Zé. Temos que enfrentar a nossa realidade.

             - O senhor fala de um jeito tão estranho Sargento!

            - Não estou falando nada de estranho Zé. Só estou falando o que somos.

            O Sargento Rodrigues falava com o seu discípulo da escuridão lá nos confins do sertão mergulhado na escuridão da noite, seguindo em frente de um lençol de mortes e coisas estranhas.

            - Sargento!

            - De novo Zé. O que quer agora?

            - O senhor esta falando de batalha. Que tipo de batalha vamos travar?

            - Daqui a pouco você saberá.

            Zé Padeiro passou a mão na sua cabeça e baixinho murmurou!

            - Não sei o que vai ser de mim. Bate Papo e Malasart, nem sequer tiverem tempo de piscar os olhos quando morreram. E eu! Pobre de mim, como será o meu fim...

            - Está ficando louco Zé?

            - Quem me dera fosse isso Sargento! Ah se fosse loucura. Talvez eu estivesse menos preocupado. Eu estou mesmo é morrendo de curiosidade Sargento.

            - Aponte a espada para o alto e grita bem alto.

            - Gritar o que Sargento?

            O sargento Rodrigues não respondeu...

            - Sargento! Não quer falar comigo!

            Para a inquietação de Zé Padeiro o Sargento  Rodrigues   continuava   em  silêncio...           

- Que merda. Que vida desgraçada. Antes eu tivesse ficado fora desta idiotice de organização.

            Deixamos agora os dois ali no meio da noite escura, perdidos no sertão e vamos até a casa do Sargento Rodrigues lá na Rua Dois de Julho na pequena Carinhanha.

            - Tem alguém lá fora chamando o papai mãe!

             - Quem será Luzia?

             - Vamos ver mamãe.

            No meio da noite mãe e filha receberam o visitante que disse:

            - Boa noite.

            - Boa noite senhor, o quê deseja?

            - Sou o Pastor Cambaleão. Venho numa missão e gostaria de saber aonde posso encontrar o Sargento Rodrigues.

            - Vamos entrar um pouco Pastor!  - exclamou Luzia com ar de sedução.

             - Não tenho tempo agora senhorita, contudo numa outra ocasião poderei me demorar.

            - O meu marido foi à casa de Bambé. Acha que Anastácia corre perigo.

            - E que rumo devo tomar?

            Com aquela roupa de dormir o corpo de Luzia fazia o Pastor Cambaleão  se perder na imaginação...

            - Margeando o Rio Carinhanha, fica após uns sessenta quilômetros a fazenda Milagre.

            - Agradeço a sua bondade senhora.

            - Não há de que seu Pastor. Estamos aqui á sua inteira disposição - relatou Luzia abraçando a mãe.

            O pastor Cambaleão ficou preocupado com a forma do comportamento da filha do Sargento Rodrigues:

            - Está amarrada em nome de Jesus.

            Relatou o Pastor Cambaleão indo em direção a casa de Anastácia. E lá na casa de Anastácia a coisa estava feia:

            - Afaste da minha casa coisa desgraçada.

            Entre gritos de horror  a pobre mulher mergulhava no desespero. Pois as coisas ruins estavam chegando para travarem a grande batalha. O vento frio com o seu mistério vinha de todos os cantos do sertão. Encolhia-se de medo do grande poder que como sempre está acima de todos os comuns que perambulam pela terra procurando um sentido ou explicação para o seu próprio destino.  Lá nos confins do sertão uma mulher indefesa esperava por socorro que nem sequer sabia se ia chegar...

            - Mateus, você conseguiu avisar o Sargento! Hem! Mateus. Responda meu Mateus, você conseguiu... Onde você está.

            E aquela mulher chorava todas as suas lágrimas na escuridão da noite do dia 20 de Abril de 1.953, lá no sertão baiano.

            - Onde está você meu Mateus.

            A pobre Anastácia não tinha a mínima idéia do que tinha acontecido ao seu filho. Que há essas horas já estava ou deveria estar na residência do diabo ou quem sabe talvez por algum lugar a vaga e até mesmo quem sabe ali ouvindo a aflição da sua pobre mãe.

            Ou sofrendo e dividindo com ela aquela dor. E já ali perto:

            - Algum problema Sargento?

            - Estamos chegando Zé.

            - Estou sentindo um cheiro estranho Sargento! O que deve ser?

            - Deve ser o missionário que está chegando. Sinto que vai ser uma linda batalha...

            - Esse missionário vai ficar do nosso lado ou vai ficar contra nós Sargento?

            - O povo de Jesus Cristo fica do lado do bem Zé. Não discriminam ninguém.

            - Então eu posso ficar do lado dele!

            - Depende da sua vontade. É como diz as escrituras sagradas.

            Parece que eles tinham passado por outra estrada e com isso não encontraram os restos mortais de Mateus. Ou será que os restos de Mateus foram consumidos por Perfume, Gina ou outro monstro...

            -  Está querendo dizer que não tenho fé!

            - Não! Quem é eu para dizer alguma coisa inerente à fé.

            - Sargento! O cheiro só aumenta cada vez mais!

             - Esqueça o cheiro e se prepare para a batalha.

            Bem antes de Sargento Rodrigues terminar de falar, uma grande explosão aconteceu na escuridão!

            - Escutou Sargento?

            - O que acha que é isso?

            - Só pode ser Miron.

            - O perigoso profeta da escuridão.

            - Ele mesmo Zé - informou o Sargento Rodrigues acrescentando:

            - É bem provável que será ele a quem vamos enfrentar.

            - Se somos iguais por que temos que lutar contra ele Sargento?

            - Para defendermos Anastácia.

            - Defender Anastácia pra que? Hem! Sargento! Não percebe que ele só deu a luz a um filho. E agora já depois de velha, sem  marido  sem filho. Ela não tem serventia nenhuma.

            - Como você sabe disso Zé!

            - O que é isso Sargento! Acha que não consigo entender as coisas. Se Chico viva com Bambé, e virou Perfume, é claro que na hora da mutação ele devorou Bambé.

            - E quanto ao Mateus? O que acha que aconteceu?

            - Se o cavalo estava com sangue, é evidente que Mateus já foi pro espaço. Portanto não vejo nenhuma necessidade de proteger essa mulher. No meu entender ela é uma imprestável.

            - Por mais velha que for uma mulher, ela ainda presta. É como se fosse uma forma que Deus fez com a intenção de multiplicar  os humanos.  

            - Não quero discordar do senhor Sargento. Porém, uma forma velha e estragada. Que valor o tem para Deus!

            - Não estamos aqui para julgar e nem para sermos julgados e sim para cumprir uma missão predeterminada por um poder superior, se fomos pagos para isso, o que devemos fazer é trabalhar Zé. É lutar...

            E um terrível som aproximava-se ainda mais...           

- Que linguagem estranha é essa, Sargento?

            - Só pode ser Gina que está que está nos seguindo. Segure forte a espada Zé. Grite alto Zé!

             - Gritar o que Sargento?

             - As três palavras que lhe ensinei Zé!

            Aflito Zé Padeiro gritou:

            - Não me lembro mais Sargento!

            - Procure se lembrar seu idiota!

            - Não me lembro Sargento. Eu mereço morrer, eu mereço a morte!

            - Luz da escuridão, olhos da serpente, espada fulminante. E em nome do nosso Senhor Jesus Cristo. Esta maldição está quebrada - relatou o Pastor Cambaleão que acabava de chegar.

            Assim que o Pastor Cambaleão falou as três palavras mágicas surgiu um enorme clarão que vinha da espada e naquele momento Zé Padeiro e o Sargento Rodrigues puderam ver o inferno. De modo que o demônio chamado Gina, voltou para lá. De onde nunca devia ter saído.

            - Eu vi o inferno Sargento, Ra, ra, ra, eu vi o inferno!

            Gritava Zé Padeiro.

            - Segure a espada seu idiota! A guerra está começando  relatou o Sargento Rodrigues.

            Naquele momento Gertrudes e os seus dois filhos Corisco e Trovão espantaram Conhaque que saiu na disparada rumo ao Rio Carinhanha.

            - Socorro! Socorro Sargento. O cavalo disparou...

            O Pastor Cambaleão gritava aflito:

            - Segura a espada Zé.

            Zé Padeiro nem tinha como ouvir o Pastor Cambaleão. Pois o seu medo era tanto que nem mesmo tinha ouvidos para nada.

            - Obrigado por ter vindo missionário!

            - Segure o livro Sargento! Precisamos dele.

            Agora o Sargento Rodrigues e o Pastor Cambaleão estavam desesperados correndo atrás do pobre Zé Padeiro montado no Conhaque disparado rumo ao Rio Carinhanha.

            - Meu Deus! Não deixe esse cavalo acabar comigo senhor?  pedia Zé Padeiro.

            De forma que o cavalo Conhaque pulou dentro do rio enquanto o demônio Gertrudes, os seus dois filhos Corisco e Trovão, juntos com o demônio Jejo que parecia esperá-los para o espetáculo. E na escuridão o demônio Jejo tentava engolir o cavalo Conhaque.

             - O que devo fazer pastor?

Cambaleão não dizia nada. Com isso a aflição de Zé Padeiro aumentava.

            - Socorro Sargento! Socorro!

            - Como posso ajudá-lo Pastor?

             - Abra o livro e leia o capítulo oito!

            - Não posso ler no escuro Pastor.

            - Abra o livro Sargento.

            E quando o Sargento Rodrigues abriu o livro uma luz fez brilhar as águas do Rio Carinhanha e de lá do alto do barranco dava para ver o demônio Jejo engolindo o cavalo Conhaque. Gertrudes e os seus dois filhos malditos perseguiam o pobre Zé Padeiro que como um enorme sapo nadava ruma a margem do rio gritando.

             - Socorro meu Deus, valei-me meu Deus!

            - Não olhe para trás Zé. Não olhe para trás gritava o Pastor Cambaleão.

            A boca do demônio Jejo parecia ser um túnel que seguia em direção ao inferno.

            - Sargento! Leia o que está escrito no capitulo oito!

            - Não posso ler no escuro Pastor.

             - Pare de olhar o rio e leia o livro.

            De modo que o Sargento Rodrigues leu:  

            - Afasta-se da terra coisa maldita. Queima a sua sede nas profundezas das águas.

            - Grite alto Sargento! Em nome de Jesus Cristo.

            - Eu não posso Pastor! Eu não tenho este direito, eu pertenço à escuridão.

            - Eu estou mandando Sargento! Fale em nome de nosso senhor Jesus Cristo.

            De maneira que o Sargento Rodrigues gritou:

             - Em nome do nosso senhor Jesus Cristo!

            Naquele momento o Sargento Rodrigues percebeu que a calma começou.

            - Pastor! Onde está o senhor? - indagou Zé Padeiro saindo do Rio.

            - Estou aqui?

            - Como posso servir ao senhor Jesus Cristo?

            - Levante as suas mãos para o alto e diz. Eu aceito o senhor Jesus Cristo como o meu único senhor. E desde já coloco a minha vida em suas mãos para que seja feita a sua vontade.

             - Eu não sei falar desse jeito Pastor.

            - Tente que você consegue.

            E assim lá na escuridão do sertão, Zé Padeiro falou como o Pastor Cambaleão tinha mandado. Era dia 20 de abril de 1953. E no momento de emoção o Sargento Rodrigues gritou:

            - Tome cuidado! Tome cuidado!

            O Pastor Cambaleão olhou para o lado e viu um homem enorme vestido com uma roupa vermelha  cintilante, que parecia produzir  luz na escuridão, e que empunhava em suas mão um grande punhal mortal.

            - Não tenha medo Sargento! Ele não tem poder contra nós.

            - Não contra o senhor. Eu estou indefeso. Ele é o Miron, o temido profeta da escuridão. Ele veio para me levar. Ele vai me levar Pastor.

            Cambaleão fechou os olhos e gritou:

            - Senhor Jesus Cristo! A tua palavra diz senhor, que somos mais que vencedores. Dê-me essa vitória senhor, para que todos possam crer no seu inigualável poder.

            Enquanto o Pastor orava o Zé Padeiro empunhou a espada e se dirigiu ao grande monstro Miron, o profeta da escuridão dizendo:

            - Lute comigo coisa do inferno! Eu aceitei ao senhor Jesus Cristo!

como o meu único senhor, como o salvador da minha vida. Lute comigo seu maldito, lute!

            Miron se dirigiu à casa de Anastácia, enquanto os três o perseguia... Zé Padeiro parecia ser movido por alguma coisa inexplicável, pois nem mesmo os cavalos do Pastor e do Sargento Rodrigues conseguiam acompanhá-lo. E ele continuava a gritar:

            - Lute comigo Miron, lute seu infernal, venha conhecer a força do Senhor Eterno. Lute seu desgraçado.

            Em frente à casa de Anastácia, existia uma grande várzea e pronto para lutar estava a grande fera Perfume e Miron o temido profeta da escuridão.

             - Cuidado Zé, agora são dois!

            - Pode ser até mil, pastor. Eu estou com o senhor Jesus Cristo. Eu sou invencível.

            E Zé Padeiro enfrentou os dois monstros da escuridão, na escuridão daquela noite escura na frente da casa de Anastácia. E feliz Zé Padeiro ordenou:

            - Vai com o Pastor, Sargento. Vão socorrer Anastácia!

            E dentro da casa de Anastácia os demônios Brilhantina e Alcanfor torturavam a pobre Anastácia.

            - Abra a porta Anastácia. Sou eu o Sargento Rodrigues. Estou com o missionário. Pastor Cambaleão.

            - Fala com autoridade Sargento. O povo de Jesus Cristo tem que falar com autoridade.

            - Eu não posso Pastor. Eu não sou de Jesus Cristo, eu sou metade humano e metade demônio...

            - Isso não existe Sargento! Ou é de Deus ou do diabo. Acredite no senhor Jesus Cristo Sargento. E em nome do senhor Jesus Cristo a partir de agora você não servira mais ao diabo. Eu declaro em nome de Jesus Cristo,  você está liberto das forças do mal. Para que a gloria do Senhor resplandeça em sua vida. Repita o que vou falar Sargento.

            - Pode falar que vou repetir Pastor.

            Assim o Pastor Cambaleão falou:

            - Nesse instante eu entrego a minha vida ao senhor Jesus Cristo...

            E quando o Sargento Rodrigues repetia as palavras que o Pastor Cambaleão falava, um forte vento começou assoprar e em poucos segundos a casa de Anastácia se espatifou, e naquela aflição o Pastor Cambaleão ordenou:

            - Leia o que está escrito no décimo capitulo do livro Sargento.

            Quando o Sargento Rodrigues leu o livro o mostro Perfume se transformou no verdadeiro Chico e se dirigiu a Anastácia dizendo:

            - Minha querida Anastácia, eu sempre te amei...     

            O perigoso Miron se transformou em Bambé, e se dirigiu a Anastácia dizendo:

            - É mentira dele Anastácia. Ele é um monstro. Não ama ninguém, foi ele que  me matou...

            - Não se aproxime deles Anastácia  ordenou o Pastor Cambaleão dizendo:

            - Zé! Onde está a espada?

            - Nas minhas mãos, Pastor!

            - Jogue-a para o alto.

            Zé Padeiro jogou a espada para o alto e em poucos segundos ele cortou os pescoços de Miron e Perfume.

            - Mãe, que saudades mãe!

            - Não Anastácia, Não é Mateus. É o diabo - informou Zé Padeiro.

            - Sargento! Leia o capitulo doze do livro - ordenou o Pastor.

            Quando o Sargento leu o capitulo doze do livro, dava para ver os demônios gritando com aflição, indo para as profundezas do inferno.

             - Estou com medo, muito medo - informou Anastácia.

            - Não precisa ter medo senhora, Jesus Cristo está neste lugar - afirmou o Pastor Cambaleão dizendo:

            - Todos de joelhos - ordenou o Pastor Cambaleão.

            E ali no terreiro, sobre as cabeças dos três que tinha restado da maldição, as mãos do poderoso discípulo de Jesus Cristo, e ele dizia:

            - Senhor Jesus Cristo, Senhor da minha vida. Vim aqui em teu nome Senhor, e apresento agora estas vidas que pela sua misericórdia foram salvas desta maldição. Oh Senhor, obrigado por este momento de grande alegria. Obrigado por ter me dado o poder Senhor, de expulsar em seu nome, estes demônios que tanto mal faziam a essas criaturas.

            E parecia que o Pastor Cambaleão nunca ia parar de agradecer:

            - Anastácia, Zé Padeiro e Sargento Rodrigues, repitam comigo as palavras que direi agora.

            Houve um minuto de silêncio naquela escuridão e em seguida:

            - De olhos fechados. Eu aceito o senhor Jesus Cristo como salvador da minha vida. E sei que só Ele é Deus. E o servirei para todo o sempre...

            E quando eles abriram os seus olhos, o pastor Cambaleão já tinha desaparecido na escuridão, até hoje eles não sabem como era a sua face.

 

FIM

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